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Os investidores tentaram, na sexta-feira, estabelecer um preço às ações da Agrenco, após a notícia de que a Louis Dreyfus Commodities (LDC) ficará com o controle da companhia - resultado de uma capitalização emergencial de US$ 68,5 milhões no negócio. Os papéis, negociados na forma de BDR, subiram 36,80% e fecharam a R$ 1,69. Na prática, estão valendo mais no mercado do que a Dreyfus atribuiu de valor à companhia (US$ 0,84 por papel - cerca de R$ 1,34).

Os papéis ficaram suspensos por praticamente uma semana. A bolsa bloqueou as transações na sexta-feira anterior, dia 20, após a notícia de que a Polícia Federal (PF) prendera três dos acionistas controladores e também administradores por suspeita de fraudes e operações ilícitas envolvendo contratos de exportação de soja. A bolsa aguardava que a Agrenco tratasse dos problemas com a PF em comunicado aos investidores.

No comunicado divulgado ao mercado sexta-feira passada, a Agrenco alega que os acionistas presos renunciaram às posições no conselho e na gestão executiva. Antônio Iafelice, além de fundador e controlador, era também presidente do conselho de administração. Os demais sócios presos, Francisco Carlos Ramos e Antônio Augusto Pires Júnior, eram também administradores e conselheiros.

Embora os investidores já estejam atribuindo às cotações na bolsa uma saída para o problema policial, é importante ressaltar que o acordo com a Dreyfus ainda não foi concluído. Depende de condições que incluem a auditoria dos negócios. A proposta da empresa francesa tem direito a exclusividade até 1º de setembro e, após 180 dias, pode resultar em multa.

Assim como a abertura de capital da companhia, a transação com a Dreyfus também inclui riscos - inclusive o de não haver oferta pela troca de controle. No comunicado de sexta-feira, a empresa deixa evidente a intenção de não realizar oferta pública. Trata-se de condição para que o acordo com a companhia francesa seja efetivado.

Quando distribuiu os BDR na Bovespa, a Agrenco já alertava, no prospecto da oferta, para regras diferentes e mais brandas que seguiria por ser uma companhia estrangeira, com sede nas Bermudas. A limitação de direitos de acionistas minoritários por esse fato afetou o interesse de alguns investidores da companhia na época da oferta para estréia na bolsa, pois a companhia não teria conseguido justificar com clareza sua opção de ter sede em Bermudas. A empresa admite, no prospecto, que "a maior parte dos membros do conselho de administração reside no Brasil e parte significativa de nossos ativos está localizada no país".

Há outras emissoras de BDR listadas na Bovespa cujas atividades são concentradas no Brasil. No entanto, no caso das administradoras de recursos GP Investments e Tarpon, por exemplo, há vantagens tributárias na manutenção da sede em paraíso fiscal - o que levou à compreensão dos investidores dessa opção.

O prospecto da oferta da Agrenco traz, nos riscos relativos às Bermudas, um capítulo exclusivo que alerta: "As leis das Bermudas diferem das leis em vigor no Brasil e podem oferecer menor proteção aos acionistas" .

Entre as reduções de direitos que os investidores sofrem estão a possível dificuldade de ajuizar ações contra conselheiros e diretos da companhia. Além disso, os próprios acionistas e controladores da companhia renunciaram, no estatuto da empresa, a qualquer direito de reivindicação ou direito de ação, tanto individualmente ou em nome da companhia, contra os diretores e conselheiros. Tal renúncia aplica-se a qualquer ato, exceto fraude e desonestidade. Para brigar judicialmente com a empresa ou seus administradores, o acionista necessita antes mostrar má-fé daquele que quiser processar.

KPMG poderá revisar balanço
A empresa de auditoria KPMG poderá revisar os balanços financeiros da Agrenco à procura de indícios de fraudes. A companhia do setor de agronegócios diz que está negociando com a auditoria a solicitação dessa nova verificação das demonstrações financeiras. A KPMG aprovou as contas da empresa no ano passado sem fazer nenhuma ressalva.

Por conta de uma investigação da Polícia Federal, três sócios da Agrenco foram presos, em Santa Catarina, sob suspeita de crimes de desvio de dinheiro da companhia, sonegação de impostos e fraude de balanço, entre outros.

Segundo a PF, a empresa foi usada pelos sócios para a realização de negócio fictício de exportação de soja. Em uma operação, Agrenco teria pago R$ 2,8 milhões por um carregamento que não existiu, sendo o dinheiro dividido entre os participantes do esquema.

O problema não foi identificado pela KPMG, responsável por assinar as demonstrações financeiras da empresa há quatro anos. O presidente da KPMG no Brasil, David Bunce, diz que o trabalho do auditor é feito por amostragem e que, nesse cenário, há risco de que alguma operação problemática passe despercebida. "Mesmo que o negócio fictício apontado pela polícia tenha ocorrido, acho pouco provável que haja muitas operações do tipo, pois dificilmente não cairiam na amostragem", destaca.

O executivo afirma que ficou surpreso com as notícias sobre os problemas na Agrenco. Segundo ele, todas as análises feitas pela auditoria mostram que o balanço reflete a real situação financeira da companhia. "Se é que tem alguma fraude ou distorção, deve ser pequena, nada que altere a decisão de investimento na empresa."

Para Bunce, o objetivo do auditor não é detectar fraude. Entretanto, caso se depare com alguma irregularidade ou com controle que não esteja funcionando, o profissional deve avisar a empresa para tomar as medidas necessárias, segundo ele. "No caso de suspeita de fraude que envolva os diretores da companhia (que é o caso da Agrenco), deve-se avisar os conselheiros de administração", explica.

O presidente da KPMG não esclarece, porém, se a auditoria chegou a alertar a direção da Agrenco ou o conselho sobre alguma suspeita de irregularidade. Ele afirma ainda que tem "confiança" nos métodos de análise usados pela empresa e que não vê necessidade de revê-los.

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